Figura 1 - Professor Silvano Raia à esquerda da foto

Transplante Hepático – História

Memorial – Transplante Hepático no Hospital das Clínicas da FMRP

“O transplante de fígado é um direito do paciente e um dever da Instituição. Por ser de alto custo e de alta complexidade, deve ser um procedimento patrocinado pelo poder público, independente da causa da doença terminal do fígado e da situação social e financeira do paciente.”O Castro e Silva “O transplante de fígado é procedimento clínico-cirúrgico de ponta, de alta complexidade que absorve e transfere tecnologia para todos os setores do atendimento terciário, sendo, na essência, uma forma de upgrade institucional. Constitui-se, per si, procedimento de caráter institucional que deve e precisa envolver equipe de especialistas de elevado nível ético, técnico, profissional, científico, acadêmico e assistencial.”O Castro e Silva

A Hepatologia no HC-FMRP-USP é fundamentalmente nova. Ela se inicia em meados da década de 80 com estudos experimentais conduzidos por Ana Martinelli e por mim em nossas teses de mestrado e doutorado, apoiados pelos professores Reginaldo Ceneviva e Ulysses Meneguelli, chefes das Disciplinas de Gastroenterologia Cirúrgica e Clínica respectivamente, que nos possibilitaram a missão de desenvolver a Hepatologia Clinico – Cirúrgica em nosso meio. Coube a nós, montar laboratórios, formar pessoal capacitado mais jovem e direcioná-los para formação cientifica e profissional continuada nesta área, a Hepatologia. Após meu doutoramento em 1986, estagiei como médico colaborador na Unidade Fígado da FMUSP e a seguir contratado como médico Assistente.Pude,então, acompanhar e participar dos primeiros transplantes de fígado realizados pela equipe do Professor Silvano Raia(Figura 1), pioneiro dos transplantes de fígado na América Latina, com o primeiro transplante de fígado feito em 1º de setembro do ano anterior, 1985. Nesse Serviço não só absorvi o entusiasmo pelo transplante, como também aprendi as bases técnicas e clínicas das hepatectomias parciais que introduzi em nosso hospital, quando aqui realizei a primeira hepatectomia regrada para tumor de fígado em 1992.

 

Figura 1 - Professor Silvano Raia à esquerda da foto

Figura 1 – Professor Silvano Raia à esquerda da foto

Em que pesasse o alto nível de assistência ensino e pesquisa em quase todas doenças do tubo digestivo, entre ela a doença de Chagas, as úlceras duodenais, o cancer gástrico avançado e precoce, até 1987, não havia cirurgião interessado e adestrado, técnica e taticamente, em ressecções parciais regradas do fígado no HC-FMRP-USP, para tratamento de tumores benígnos e malígnos do fígado. Para os pacientes que necessitavam de tratamento cirúrgico que implicavam em ressecção hepática parcial, estes eram encaminhados para outros locais, ou então convidava-se pofessores visitantes para virem operá-los em nosso hospital. É importante enfatizar que, até então, os cirurgiões mais jóvens acabavam se especializando em outras áreas cirúrgicas, mesmo dentro da gastroenterologia, cujas doenças eram mais prevalentes em nosso meio. Assim, nosso hospital não era centro de referência em doenças do fígado. A partir do final de 1991, após meu retorno de São Paulo, do Serviço do Professor Silvano Raia,  iniciamos um programa que pode ser considerado bem sucedido de ressecções parciais regradas do fígado em casos de tumores malignos e benignos do fígado. Passamos a operar pacientes, com tumores hepáticos oriundos da gastroenterologia clínica, e com metástases hepáticas de tumores primários do colon e reto, da Disciplina de Proctologia do então chamado Departamento de Cirurgia, Ortopedia e Traumatologia, hoje Cirurgia e Anatomia. Em 1992 com a criação do ambulatório Especializado de Doenças Cirúrgicas do Fígado,  o número de casos foi aumentado consideravelmente o que já começou a conferir ao HCFMRP-USP o status de Centro de referência para tratamento de doenças do Fígado. Começamos a receber pacientes, portadores de hepatopatias crônicas, tanto da cidade de Ribeirão Preto como de várias outras, desta região, Sul de Minas, Mato Grosso do Sul e Goiás.O Hospital das Clínicas passava a ser o único Serviço estruturado da região, com protocolos  bem estabelecidos para tramento de tumores hepáticos benígnos e malígnos. Atualmente, em janeiro de 2009, contamos com aproximadamente 200 hepatectomias, a maioria delas realizadas nos últimos dez anos (Figura 2).

Figura 2 - Número de Ressecções hepáticas parciais de 1999 a dezembro de 2008

Figura 2 – Número de Ressecções hepáticas parciais de 1999 a dezembro de 2008

Este programa de ressecções hepáticas parciais proporcionou a mim e aos mais jovens, que se formariam,por volta do ano de 1999, a base necessária para o transplante de fígado. Alguns deles se agregaram definitivamente ao Grupo, como o Dr. Ajith Sankarankutty (Figura 3) que por três meses, em 2000, também estagiou na Unidade de Fígado, em São Paulo, Dr. Gustavo Ribeiro de Oliveira (Figura 4) que após 4 anos de residência médica em nosso hospital completou sua formação em cirurgia do fígado com o Professor Leonardi na UNICAMP, Dr. Ênio David Mente (Figura 3), também ligado ao Grupo, com formação toda feita entre nós. Em 1997 estagiei com os professores Antoni Rimola e Luiz Grande no Hospital Clinic de Barcelona.O intercâmbio com o Hospital Clinic e com a Unidade de Fígado da FMUSP, que já se dava há mais de 13 anos, através dos Professores Silvano Raia, Sérgio Mies e mais recentemente com o Dr. Paulo Massarollo, foi útil para a organização do nosso programa de transplantes. Então, ao longo dos anos, adquiriu-se a fundamental “visão do todo” para de fato viabilizar institucionalmente o transplante de fígado. O nosso entusiasmo mais o incentivo constante do Prof.Sérgio Zucoloto colaborou em muito para o plantio da semente que gerou o grupo integrado de transplante de fígado nos anos 90.

Figura 3 - Professores Ênio, Orlando e Ajith

Figura 3 – Professores Ênio, Orlando e Ajith

Figura 4 - Professores Orlando e Gustavo Ribeiro

Figura 4 – Professores Orlando e Gustavo Ribeiro

Anteriomente,ainda na década de oitenta,participamos Dra Ana Martinelli e eu, em 1985, da criação da reunião interdisciplinar de Fígado, que acontece semanalmente, envolvendo discussão de casos e temas de Hepatologia com a participação de clínicos, patologistas, pediatras e cirurgiões. Apesar de esforços individuais, com uma Hepatologia adolescente, porém atuante e produtiva clínica e experimentalmente, assistia-se uma proliferação de grupos de transplantes de fígado na cidade de São Paulo, no interior do nosso estado e no sudeste do país. Assistia-se o aumento de filas de espera de pacientes em busca de transplante. Assim, em maio de 2000, partindo do pressuposto que o transplante é de envergadura institucional, foi constituído o GRUPO INTEGRADO DE TRANSPLANTE DE FÍGADO visando descaracterizar a atitude individual e torná-lo institucional, multi-disciplinar, interdepartamental com objetivo precípuo de realizar o transplante hepático e atender aos anseios de todos, mas, sobretudo aos dos pacientes necessitados. Houve as primeiras reuniões, as deliberações e finalmente a oficialização do Grupo perante o nosso universo acadêmico-assistencial com o valioso apoio da diretoria da FMRP-USP, através dos Profs. Drs. Michel Pierre Lyson e Ayrton Custódio Moreira, e da superintendência do HC-FMRP-USP, através do Prof. Dr. Marcos Felipe Silva de Sá. As equipes clínicas e cirúrgicas estavam formadas. Acordos com vários laboratórios e com a Fundação Hemocentro foram realizados. Aderiram ao Grupo, a Radiologia, através dos Professores Jorge Elias Jr e Valdair Francisco Muglia; a Pediatria, através da professora Maria Inez Machado Fernandes e da Dra Regina Sawamura; a psicóloga Patrícia Duarte Martins; o Professor Aníbal Basile Filho e sua equipe do Centro de Terapia Intensiva; as bioquímicas Maria Eliza Jordani de Souza, Clarice F. Fina Franco, Maria Aparecida N. C. Piccinato e Maria Cecília Jordani Gomes. A enfermeira chefe do HC, Maria José R. Stopa, Luci Romero G. Rossi, Cassandra Fernandes Marcondes, Rosemary Bredo Pozze e Dulce Ferreira da Silva deram apoio incondicional ao nosso empreendimento. Karina Dal Sasso, e a auxiliar de enfermagem Dulcinéia Gomes da Cunha foram de fundamental importância na logística dos transplantes. Adriana Augusta Lopes de Araujo Lima, pós-graduanda e cirurgiã ligada ao Grupo, a meu pedido, criou a logomarca aqui apresentada na figura 5, e que sugere o significado das várias possibilidades técnicas do transplante de fígado numa visão, sobretudo, otimista.

Figura 5 - Logomarca do Grupo Integrado de Transplante de Fígado

Figura 5 – Logomarca do Grupo Integrado de Transplante de Fígado

Tudo estava pronto. Dois mil e um despontou trazendo o novo século e a certeza da ousadia precisa e calculada do primeiro transplante como marco esperado de uma longa história. No dia primeiro de maio de 2001, surgiu um doador na Unidade de Emergência e assim, realizamos o primeiro transplante de fígado no HC-FMRP-USP, que terminou na tarde do dia dois de maio de 2001 (Figura 6). O paciente transplantado, vindo da cidade de Campinas, com ótima evolução pós-operatória, recebeu alta hospitalar dez dia após a cirurgia. Participaram direta ou indiretamente deste primeiro transplante quarenta pessoas. Isto posto, estava consolidada a instalação definitiva do terceiro centro de transplante de Fígado do Interior do estado de São Paulo.

Figura 6 - Foto do 1º transplante de Fígado do HC-FMRP-USP em 1º de Maio de 2001

Figura 6 – Foto do 1º transplante de Fígado do HC-FMRP-USP em 1º de Maio de 2001

Figura 7 - Professores Sérgio Zucoloto e Orlando

Figura 7 – Professores Sérgio Zucoloto e Orlando

Figura 8 - Professores Orlando e Ana Martinelli

Figura 8 – Professores Orlando e Ana Martinelli